O preço da arroba bovina no Estado de São Paulo, uma das referências do mercado brasileiro, voltou a registrar recordes consecutivos no fim de março, apertando as margens de frigoríficos e do varejo.
O indicador Esalq/BM&FBovespa do boi gordo atingiu 147,61 reais/arroba na terça-feira, um patamar recorde. A valorização é de mais de 17 por cento em 12 meses.
“Tem um pouco de euforia com esses patamares de preço”, disse Leonardo Alencar, gerente-executivo de Inteligência de Mercado na Minerva Foods, uma das maiores produtoras de carne bovina do Brasil.
“O pecuarista que faz a conta começa a se perguntar… Como meu boi só sobe e a economia toda piorando?”, afirmou o executivo à Reuters.
A explicação está principalmente na oferta apertada de bovinos, muito mais do que na demanda, dizem os especialistas.
“Nós há alguns anos estamos alertando que existe um grave gargalo na produção de bezerros”, disse o diretor da consultoria Informa Economics FNP, José Vicente Ferraz.
O diretor de Relações com Investidores da JBS, maior processadora de carnes do mundo, Jeremiah O’Callaghan, lembrou que a partir de 2010 o setor frigorífico no Brasil vinha registrando margens bastantes razoáveis, o que estimulou o abate.
“(O Brasil) vem aumentando a produção de carne bovina mais rapidamente do que o rebanho vem crescendo”, disse ele. “O que determina o preço do boi hoje é mais oferta do que a demanda pela carne… Estamos num mercado relativamente enxuto.”
Os contratos futuros da BM&F Bovespa apontam a arroba do boi gordo acima de 150 reais em todo o segundo semestre.
MERCADO INTERNO
O Brasil produziu aproximadamente 8,5 milhões de toneladas de carne bovina em 2014. Deste total, cerca de 81 por cento ficaram no mercado interno e 19 por cento foram exportados, segundo levantamento da Informa FNP.
A lógica seria que os consumidores brasileiros, que absorvem uma fatia tão grande da produção nacional, pagassem pela carne o valor proporcional à alta do preço do boi gordo.
No entanto, os analistas lembram que há uma forte resistência no varejo a preços mais elevados que os atuais, inclusive por causa da inflação em geral, que corrói o poder de compra da população.
“O varejo está diminuindo margem e o frigorífico está diminuindo margem, e isso sinaliza que o consumidor não está aceitando essas altas”, disse o diretor da Scot Consultoria, Alcides Torres.
Segundo a Scot, a margem dos frigoríficos fechou março em 8,4 por cento, pela relação entre o valor pago pelo boi gordo e os valores obtidos na venda de carne com osso, couro, sebo e outros subprodutos. No início de março, esse índice era de 16 por cento.
Economistas projetam inflação acima da meta, juros elevados e uma retração de 1 por cento no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro em 2015.
“Todo esse cenário econômico… acaba criando uma expectativa de que o preço do boi está descolado em relação à economia, que está desacelerando, dando sinais negativos”, disse Alencar, da Minerva.
EXPORTAÇÕES SUSTENTAM
O setor de carne bovina do Brasil, maior exportador global, projeta uma demanda aquecida no exterior, o que deverá contribuir para manutenção dos abates e dos preços elevados para o boi gordo ao longo de 2015.
“O consumidor interno pode não ter poder aquisitivo, mas o externo pode ter. A carne do Brasil está ficando mais barata em dólar”, disse Ferraz, da FNP.
A forte desvalorização recente do real frente o dólar torna os produtos brasileiros mais atrativos para compradores externos e também encarece, na moeda local, produtos balizados em preços internacionais.
A provável abertura do mercado da China e um bom desempenho das aquisições de Rússia, Chile, Egito e Irã, por exemplo, deverão garantir bons embarques para a carne bovina brasileira este ano, disseram os especialistas.
A Abiec, associação que representa os frigoríficos exportadores, projeta embarques recordes de 1,7 milhão de toneladas de carne bovina em 2015, ante 1,56 milhão em 2014.
PRESSÃO SOBRE OS PEQUENOS
A estratégia de escoar para o exterior a produção que não for absorvida no mercado interno não é acessível para pequenos frigoríficos, que deverão sofrer bastante em 2015.
“Vender carcaça não fecha a conta da compra do boi. Se acrescentar couro e sebo, se começar a desossar a carne, começa a melhorar essa relação. Se incluir exportação, melhora um pouco mais”, ressaltou Alencar, da Minerva.
A tendência, segundo os executivos dos grandes frigoríficos, é de muitas dificuldades para os pequenos em 2015, até com fechamentos de unidades.
“Quem passar de 2015, fica (no mercado)”, projetou o executivo da Minerva.
O’Callaghan, da JBS, lembra que muitas redes de supermercados do Brasil já começam a demandar certos padrões na carne ofertada, sem contar as certificações e exigências necessárias para a exportação.
“Pela sofisticação do mercado, você vai eliminando algumas empresas que não conseguiram atingir esse grau de exigência. Tem que haver um investimento”, disse o executivo.
Mesmo assim, os executivos dizem que as grandes empresas não irão aproveitar a fragilidade das concorrentes menores para comprar frigoríficos, como já ocorreu em outros anos, uma vez que a capacidade ociosa ainda é muito grande no setor.
Autoria: Reuters
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